domingo, outubro 05, 2008

ERCS igual a PIDE

Esta Entidade Reguladora da Comunicação Social não passa duma policia política igual aos tempos da PIDE. Foi criada única e exclusivamente para vigiar e punir os orgãos de comunicação social que não estão alinhados com o poder. É vergonhoso este controlo da comunicação social, feito por gente paga a peso de ouro, por parte dos socialistas. É vergonhoso esta recomendação de exigir que António Vitorino tenha de ter o mesmo tempo de antena de Marcelo Rebelo de Sousa.

quinta-feira, outubro 02, 2008

“Este mundo era o vosso”

Público 17.09.2008, Rui Ramos

E se este mundo, desigual e inviável, tivesse sido o melhor mundo possível para a maioria de nós?
Entre o momento em que escrevo e aquele em que o leitor vai poder ler o que escrevi terão passado talvez vinte e quatro horas. Nos últimos meses, vinte e quatro horas têm sido muito tempo. O que terá entretanto acontecido, no instante em que o leitor chegar a esta frase? Haverá outro banco americano por terra, com todos os índices bolsistas à procura da parte de baixo dos gráficos? Terá Putin recuperado mais uma antiga colónia russa? Estará a Bolívia já “libertada” daquela parte do povo que não é “povo”, porque não partilha as opiniões do Presidente?Desde há meses que muita gente tem vindo a ler nas entranhas deste noticiário os sinais apocalípticos do fim de um mundo - aquele em que temosvivido. E, se esse for o caso, talvez seja o momento de lhe dedicarmos alguma reflexão - de acordo com o velho princípio de que a lucidez sobre ascoisas só nos chega ao crepúsculo. Juram-nos que, quando acabar, este mundo não há-de merecer uma lágrima ou um suspiro. Porque era um mundo em que os ricos eram cada vez mais ricos, e os pobres cada vez mais pobres, ou porque andava à mercê da irresponsabilidade e ganância de uns quantos empreendedores sem freio. A desgraça do que existe há-de assim levar-nos em direcção à justiça e à administração iluminada das coisas.Talvez convenha examinar de perto os termos em que esta aspirina sábia nos tem sido ministrada. Que fizeram os gananciosos? Basicamente, admitir à festa mais gente do que, segundo parece, aconselhava a prudência. Para ganhar dinheiro, claro, e não por altruísmo - e é por isso que muitos, para quem o motivo do lucro é um crime em si, se recusam a reconhecer o que tudo isto, no fundo, foi: uma democratização insustentável da riqueza. Donde veio o famoso “subprime”, a não ser dos mecanismos inventados para fazer chegar crédito àqueles a quem um banqueiro à antiga nunca teria dado uma hipoteca ou um cartão? Os poderes públicos ajudaram, com políticas monetárias generosas (sobretudo na América).A ganância não ficou por aqui. Os irresponsáveis transferiram os empregos que a maioria de nós já não queria para outras partes do mundo, onde foi possível manter baixos os preços do que nos apetece comprar. Assim, e contando com o Estado social para as demais necessidades, pudemos consumir roupa, electrodomésticos, férias e empréstimos sem pensar demasiado nos custos. As redes de balcões de crédito, os novos bairros, os centros comerciais, com os seus hipermercados e agências de viagem, eram só para os “ricos”?Caro leitor: se a proverbial hipocrisia de Baudelaire o não cegou completamente, sabe muito bem que não. Havia pobres? Havia, e não vou discutir se eram ou não “relativos”. Mas sem os gananciosos vai deixar de haver pobreza?
Admitamos que tudo foi loucura. Como voltar aos eixos? O mercado, explicam-nos, não se corrige si próprio. Cabe aos funcionários públicos corrigi-lo. Eis uma ideia curiosa. Porque é precisamente o contrário que vemos: o mercado está a corrigir-se (daí os colapsos bancários), e aintervenção do Estado (do género a que o Tesouro americano finalmente se escusou no caso do Lehman Brothers) é desejada ou exigida precisamente para evitar essa correcção. A fim de poupar os “ricos”? Não: a fim de poupar os “pobres” que se habituaram a viver acima das suas possibilidades. Ou seja, espera-se que o Estado use o seu poder para conservar e garantir os resultados da irresponsabilidade e da ganância. Não discuto as boas intenções: ninguém quer casas abandonadas e centros comerciais fechados. Mas não nos enganemos sobre o que andamos a pedir: trata-se de substituir a bolha do mercado pela bolha do Estado. Já não é a primeira vez que, no Ocidente, nos encontramos neste ponto. Há uns 30 anos, o Estado foi chamado para salvar um outro mundo, o das indústrias do pós-guerra, comprometidas pelo preço do petróleo e por salários irrealistas. Em Portugal, o Estado acorreu ao fogo com tanto entusiasmo, que ficou a queimar-se durante anos, com as tais indústrias ao colo. O estouro da bolha do Estado chamou-se “inflação” (o “subprime” dos burocratas). E ela já está aí outra vez, com o seu alfinete sem graça.
A religião do progresso, a última encarnação da mentalidade beata, ensina-nos que o mundo de hoje nunca pode ser justo ou próspero porcomparação com o de amanhã. E se não for necessariamente assim? E se este mundo, desigual e inviável, tivesse sido o melhor mundo possível para a maioria de nós? Não, caro leitor, este mundo não era o “deles”, era o nosso, era o seu.Não pergunte por quem os sinos dobram.